Cronica - As sete luzes de minha mãe - Manoel Messias Pereira



As sete luzes de minha mãe


Minha mãe foi uma mulher de sete filhos. Uma mulher negra, que nasceu, cresceu, teve uma experiência de inocência, adolescência, conheceu um homem o meu pai, tentou se casar num cartório, teve-me como primeiro filho dos sete.

Nasci num lar pobre, enquanto meu pai trabalhava descarregando caminhão que trazia caroços de algodão, café, amendoin, tudo para o refino de uma companhia de óleo que existia na cidade de São José do Rio Preto, cujo a marca era "A Patroa" e "A dona", e a empresa era a Swift do Brasil. E minha mãe trabalhava fazendo faxinas, lavando roupas e dividindo o tempo em casa como trabalhadora, dona de casa e mãe.  Nossa casa era muito maior do que as casas de hoje, os cômodos eram grandes as paredes feitas com um tijolo de barro amarelo. E o telhado era muito engraçado, as telhas daquelas chamadas comun, que todos diziam feitas por seres escravizados. Ficávamos olhando o céu, eu e minha mãe, observando as  falhas dos  buracos no telhado.  O ruim era quando chovia, enchíamos a sala de canequinha de massa de tomate e tudo parecia uma orquestra. Mas nas noites escuras, ficávamos olhando os vagalumes, e mamãe cantava e contava pra mim um monte de historinhas. 

O meu nome Manoel Messias minha mãe colocou-me pensando em Jesus Cristo. Ela dizia que ele era o Rei dos reis, e foi anunciado por Moisés, era quem deveria trazer a as boas novas, segundo o a Bíblia Sagrada. E pensando nisso deu-me esse nome.

E mesmo eu sendo criança, aos dois anos minha mãe engravidou pela segunda vez. E minha mãe começou a passar mal, Os seus olhos que eram grandes, começou a ficar vermelhos e ela foi perdendo as vistas, ela passou a sentir-se corrimentos nas suas parte íntimas e acabou indo para um hospital. Ali precisou fazer raspagem, passar luzes, até no útero. E os médicos acreditava que alguém poderia morrer ou ela ou o bebê. Todos os problemas possíveis ocorreram. Alguém disse-me mais tarde que muitas das dores e coisas que ocorreram eram fruto de doenças veneras que ela contraiu de meu pai. Ambos tiveram que fazerem tratamento. E a desgraça era que o meu pai era um exímio viralata como homem, um canalha, um bonachão, um ser promíscuo, que mantinha uma vida fora de casa com muitas prostitutas.

Por graça e glória, a minha mãe entregou-se as suas orações e pediu para Nossa Senhora Aparecida para vir nos socorrer. E minha irmã nasceu, fraca, teve problemas no nascimento. Mas minha mãe atribuía o nascimento da bebê ao milagre de Aparecida em casa.  Minha irmão recebeu o nome de Conceição Aparecida. Como aquela santa que fez o milagre dos peixes para os pescadores do Rio Paraíba no Estado e São Paulo.

Depois do nascimento de minha irmã quando a minha mãe saía para trabalhar ficava e eu e Aparecida (a nenê). Tinha em casa um carrinho de mão e eu enquanto criança colocava a minha irmã dentro calçava com almofadas e travesseiros e empurrava lá no terreiro. Era um terreirão, calçado todo com tijolos e também no fundo havia um forno a lenha que no final de semana fazia-se pão.E para entrar em casa havia uma escada de madeira, e muitas vezes meu pai, ficava caído nos seus degraus, pois ele chegava bêbado e não conseguia entrar em casa.

Quando eu ainda estava com cinco anos, minha mãe teve outra criança. O meu pai trabalhava descarregando caminhão lá pelas bandas do Paraná. E não chegava nunca. Minha mãe num princípio de dezembro entrou em trabalho de parto. E eu desesperado enquanto criança perguntei a ela o que devia fazer. E ela pediu para correr e que fosse até a minha avó por parte do meu pai a vó Maria, Fui  lá até o meio do caminho um desgraçado cachorro correu atrás de mim. Chegando no fim da rua quem atendeu-me foi a minha bisavó a dona Gertudes que falou que ia chamar a dona Rosa a parteira. E essa desgraça de velha parteira ia saindo de casa quando lembrou que ela estava sem calcinha que era aquela cirola que parecia um cuadô de café. E antes de sair tinha que beber um gole de cachaça só depois ia fazer o parto.

Enquanto que a parteira fazia os procedimento fui chamar a outra avó. Andei pelos matos quase seis km, até a casa de dona Ana. A minha avó por parte de mãe. O engraçado é que todos os meus avós também eram meus tios, pois todos os casais de minha casa eram primos. A minha avo Donana, como todos chamava-a, falou preciso levar umas duas galinha, Farei uma rudia e tu  leva um pouco de lenha pra fazer o angu e o pirão. 

Assim chegamos quase na hora do almoço e minha avó começou a fazer a comida com e o pirão da mãe. Por outro lado vi aquele cheiro de arruda com cachaça, E acho bem interessante isto, pois agora as pessoas tem filhos mais não tem mais esse ritual. Depois disto ficava quarenta dias do resguardo e não podia quebrar a dieta. A mulher ficava na cama e toda a família vinha em casa. Eu ficava observando achava que tudo estava virando um galinheiro. Pois aquele converseiro de mulher era uma barato e cada uma falava uma coisa diferente e eu ficava prestando atenção. Muitas coisas eu não entendia. Mas ria muito com aquela zoeira toda. E falava sozinho brincando outro falou pro outro e aoutra falou pra outra e ou outro e a outra e ria pois ninguém estava entendendo nada. Até que minha mãe falou que conversa besta essa em menino. Eu disse estou imitando essa converseira de adulto que virou a minha casa e todos riram.

O tempo passou meu pai foi embora. Eu pensei que a fábrica de fazer nenê, de minha mãe tinha fechado. Mas não ela apaixonou de novo, por sr. Aparecido e assim nasceu o meu irmão o Nenê, como chamamos o Florêncio Pereira Duarte. Era um menino que recebeu muitos presentes. Ele nasceu no dia do culto de Ogun. A parteira dele era a Maria Jose, uma morena de tirar o folêgo, cabelo caracolado. Eu tinha  tio Joel que olhava pra ela sem piscar. E nós a mulecada ficava gritando pisca Joel pisca negrão, pisca Joel, Pisca, e o Negrão não piscava.

E depois de mais dois anos nasceu a Rosana, ela nasceu na Santa Casa o ritual já era outro. Minha mãe começou a ter as dores do parto chamamos o pronto socorro e ela foi pro hospital. Sem mistério. 

O Sr. Aparecido entrou em choque entre a realidade e suas fantasia enlouqueceu e foi embora. e a minha mãe a dona Florência ficou sozinha. Passou uns tempos e vai apaixonar mais um vezdepois de arrumar uma penca de namorado.

Deste ultimo namorado, Sr. Jesus ela tem um casal de filhos, o Luiz que ela chamava de Luz, que foi o primeiro que morreu aos trinta e nove anos. Um menino que desde garoto teve um trauma de infância pois o pais abandonou e ele sempre ficava aguardando e o pai dele nunca mais apareceu. E a sua irmão legitima a Bárbara, é minha irmão porém tive pouco contato. E o ritual de luz era o do hospital, não tinha a festa de casa.

Há quem diga que as mães dão a luz, pois é uma dádiva do divino. O que sei é que minha mãe foi um grande mulher que conseguiu reunir num mundo só suas sete luzes, que saira, que partiram de sua barriga. Cada um de nós somos seres que tiveram os desígnos da existência. Uma existência em que a dor e o amor está sempre presente.

Porém vemos no taoísmo e no budismo que são religiões ou crenças na qual há o desejo de libertar-se do ciclo da dor  do nascimento e da morte, descobrindo-se o nosso verdadeiro ser, para o além das ilusões e do desejo. E no Sutra do Diamante dizem  que estar liberto em todas as formas esse é ponto central. E minha mãe era assim uma grande Umbanda em que tudo se encontra e reelabora-se em teorias e significados. era também alguém que acreditava num socialismo não como uma doutrina importada daqui ou dali, mas como movimento orgânico e seu marxismo era descobrir as palavras de Karl  Marx, na análise do capitalismo e seu desenvolvimento. E no seu conhecimento de mundo aprendeu ser indispensável do pensamento dialético em que todos possam viver na plenitude dos fundamentos de esperanças.


Manoel Messias Pereira

professor de História, poeta e cronista
São José do Rio Preto-SP
Membro da Academia de Letras do Brasil -ALB



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