Artigo - 30 anos sem Mãe Mirinha do Portão - Manoel Messias Pereira





Altamiro Maria Conceição Souza
mãe Mirinha do Portão
nasce  - 21/12/1924  -  falece em 18/02/1989

30 anos Sem Mãe Mirinha do Portão

Filha de Sr. Nestor e D. Maria Lena, cresceu como toda criança carente da periferia e com 8 (oito) anos de idade foi morar com sua madrinha na cidade de Salvador com o objetivo de ajudar nas tarefas domésticas.

Não demorou para que os chamados viessem para que a menina Mirinha fosse para a Religião do candomblé. Era pulando as janelas furtivamente que Mirinha assistia a algumas festas de Candomblé sem perceber que teria um futuro brilhante na Religião. Desta forma com a ajuda de sua irmã carnal Claudina (apelidada de Coló) que mesmo sem ser iniciada na religião tinha uma imensa fé no seu Nkisi Dandalunda e mantinha alguns rituais em devoção a ela. Esta irmã levou Mirinha a casa do então jovem Pai de Santo João Alves Torres Filho, que viria a ser mais tarde o lendário Joãozinho da Goméia, cujo nome Goméia foi incorporado ao seu nome devido ao grande interesse popular em saber sobre o Pai de Santo e seus conhecimentos da Religião.

Mirinha é iniciada aos sete anos de idade, para o Nkisi Mutalombô e tem como segundo Nkisi Bambulusema, juntamente com mais 18 muzenzas. Na época foi de grande ousadia o feito de tirar, como se fala na linguagem do Candomblé, um barco de 19 muzenzas, mas Joãozinho da Goméia era assim (desafiador e polêmico), logo, desta forma nasceu para o Candomblé Congo/Angola da Bahia e do Brasil a Monankisi "Sessa Dya Umbula", sendo chamada pelos seus irmãos de santo por Sessetu, o nome de seu erê, sendo filha pequena de Kilondirá chamada carinhosamente por Mirinha de Mãe Kiló.

Seguindo seu caminho dentro da Religião, Mirinha retorna para Portão e no dia 25 de dezembro de 1952 ela tira seu primeiro barco, composto por dois muzenzas: Antonio José da Conceição do Nkisi Kavungo e Maria Augusta do Nkisi Nkosi Mukumbi, nascia aí o Terreiro São Jorge Filho da Goméia e, tal como aconteceu com o seu Pai de Santo, o nome da localidade de Portão seria incorporado para sempre ao seu, agora chamada de Mirinha do Portão.

No transcorrer de sua vida, Mirinha casa-se com Jarson da Costa Souza, funcionário da Prefeitura de Salvador, mais conhecido como Garrincha, que muito contribuiu para a elevação do nome de Mirinha de Portão nacional e internacionalmente.

Muito trabalho social foi desenvolvido por Mirinha de Portão na localidade onde o Candomblé está implantado, tais como: Transportes Públicos, Hospitais, Postos de Saúde, Campanhas de Alimentação (distribuição de cestas básicas feitas por ela com a ajuda de alguns empresários), entre outras ações. Participou das filmagens cinematográficas da obra de seu dileto amigo Jorge Amado: Os Pastores da Noite e Tenda dos Milagres, dando visibilidade a comunidade de Portão

Sua gratidão ao Nkisi Dandalunda era comovente as festas de Mutalambô aconteciam num sábado e no domingo acontecia o Presente de Dandalunda na Lagoa do Abaeté encerrando a festa. A primeira mãe pequena da Casa foi Nitinha de Oxum, hoje Ebômi do Ilê Axé Iya Nasso Oka - Terreiro da Casa Branca, em seguida Maria das Graças Neves neta e herdeira do Terreiro São Jorge Filho da Goméia iniciada para Dandalunda em 3 de julho de 1977, ocupou o posto de mãe pequena até a morte de Mirinha.

No dia 18 de fevereiro de 1989 o mundo amanheceu mais triste, faleceu Mirinha do Portão, após quatro anos de luta contra um linfoma.

A perda de Mirinha do Portão deixou um enorme vazio na vida de todos que a conheceram, conviveram com ela e até mesmo na vida da Comunidade de Portão que certamente perdeu uma voz autêntica que dedicou sua vida a luta pela igualdade social e racial.

Mas, pessoas como Mirinha do Portão são generosas em demasia para deixarem esta vida sem deixar os frutos daquilo que semeou a vida inteira.

Existem alguns Terreiros remanescentes do Terreiro São Jorge Filho da Goméia, como o Onzo Nguso Za Nkisi Dandalunda Ye Tempo - Terreiro Mokambo localizado na Rua C, Quadra 8, Lote 4 - Loteamento Vila Dois de Julho - Trobogy - Salvador-Bahia, que é dirigido por Anselmo Santos - Tata Dya Nkisi, filho de Mãe Mirinha.

Onzo Tata Kavungo - Terreiro São Lázaro localizado na Rua Queira Deus n 66 - Portão - Lauro de Freitas-Bahia, que é dirigido por Valdete dos Santos - Mametu Dya Nkisi, filha de santo e sobrinha de Mãe Mirinha.

O Terreiro São Jorge Filho da Goméia, depois da ausência de Mirinha do Portão, por impossibilidade pessoal da herdeira Maria das Graças Neves (Gracinha de Dandalunda)retornou as suas atividades dirigido provisoriamente por sua sobrinha e filha de santo do Nkisi Kavungo Valdete dos Santos, iniciada em 18 de fevereiro de 1971, tomando a Dijína Tarainssumbu. Hoje Mãe Tunga como é chamada, chefia o Onzó Tata Kavungu. Com o afastamento de Valdete dos Santos e, novamente, por motivos pessoais da herdeira Maria das Graças Neves (Gracinha de Dandalunda), está sendo dirigido pela irmã carnal de Gracinha, outra neta de Mãe Mirinha chamada Maria Lúcia Santana Neves, iniciada para o Nkisi Bambulusema em 27 de dezembro de 1986, tomando a Dijína de Kamurici.

A Prefeitura de Lauro de Freitas prestou uma homenagem a Mirinha de Portão dando o seu nome a um Terminal Turístico que existe às margens do Rio Joanes, o mesmo rio onde Mirinha viveu as traquinagens de infância e onde as águas de Dandalunda lhe serviram de companhia durante toda a vida.

No dia 15 de abril de 2004 o Terreiro São Jorge Filhos da Goméia foi tombado como Patrimônio Cultural do estado da Bahia, através do IPAC - Instituto do Patrimônio Artístico e Cultoral do estado da Bahia, fruto do árduo trabalho de Mirinha desenvolvido durante anos.



O Conhecendo Museus vai à Bahia e apresenta o Museu Comunitário Mãe Mirinha de Portão. Com o objetivo de preservar a cultura banto, a Associação São Jorge Filhos da Goméia criou o museu. Ali ocorrem cursos de informática, oficinas de dança, capoeira e percussão para crianças, jovens e adultos do bairro do Portão, na cidade de Lauro de Freitas.

O acervo do museu é composto por objetos em ferro, prata, madeira, palha, tecido, papel e outros materiais. Os objetos pertenceram à Mãe Mirinha de Portão, aos projetos educativos e culturais da Associação São Jorge Filho da Goméia e alguns são cedidos por outras instituições.

Em 2004, Mãe Mirinha, mentora da associação, mais uma vez teve seu trabalho reconhecido. Em 15 de abril, o Terreiro São Jorge Filhos da Goméia, onde fica o museu, foi tombado como Patrimônio Cultural do Estado da Bahia, através do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural do Estado da Bahia (IPAC), fruto do árduo trabalho de Mirinha, desenvolvido ao longo anos.

O episódio do Conhecendo Museus – edição Museu Comunitário Mãe Mirinha de Portão dará a oportunidade ao telespectador de conhecer e se aprofundar na tradição afro.



Manoel Messias Pereira

professor de história, cronista, poeta
Membro da Academia de Letras do Brasil - ALB
São José do Rio Preto-SP. Brasil

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