Memórias de um guerrilheiro — A vida e a trajetória de Carlos Nicolau Danielli
Um dos cérebros do PC do B na luta contra a ditadura militar no Brasil, Danielli foi torturado e assassinado, mas manteve-se fiel aos seus ideais e companheiros até o fim
“A causa da morte é anemia aguda traumática produzida por projétil de arma de fogo, cuja direção foi de trás para a frente, ligeiramente de baixo para cima e no plano sagital”. Foi dessa maneira que, segundo o laudo do Instituto Médico Legal (IML) do DOI-Codi de São Paulo, foi morto Carlos Nicolau Danielli, de 43 anos, dirigente do Partido Comunista do Brasil (PC do B) e um dos cérebros do partido na organização da luta armada de combate à ditadura. No dia 5 de janeiro de 1973, a morte de Carlos, em um suposto confronto com a polícia, era divulgada nos maiores jornais da época, como o “Jornal do Brasil” e a “Folha da Tarde”, onde o militante era chamado de “subversivo”, “terrorista” e “aliciador de jovens”.
Mas a vida de Carlos destoava desses adjetivos que recebeu. Nascido em 14 de setembro de 1929, na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, Carlos Nicolau Danielli era o mais velho dos 11 filhos de Pascoal Egídio Danielli e Virgínia Silva Chaves. Se interessou cedo pela política, com o desejo de seguir os caminhos do pai, que foi eleito deputado pelo Rio de Janeiro em 1945, muito bem votado para os padrões da época com mais de 2.400 votos. A tendência do Carlos para o socialismo também era visível desde pequeno. Sua irmã Virgínia Danielli conta que ele sempre foi uma criança protetora, brincalhona, que gostava de fazer brinquedos de madeira e sempre os dividia. “Ele gostava de fazer carrinho de madeira, jogar bola, jogar malha, fazer carrinho de rolimã. E sempre fazia para todos os irmãos e vizinhos, não só para ele”.
Aos 16 anos, Carlinhos, como era chamado pela família, começou a trabalhar e ingressou na União da Juventude Comunista, a exemplo do pai, que fazia parte do Partido Comunista do Brasil antes da cisão, no fim dos anos 50, quando o PCB passou a se chamar Partido Comunista Brasileiro e o PC do B foi criado. Autodidata, Carlos se destacou e ganhou posições dentro do PCB, atraindo a atenção da velha guarda do partido, impressionando pela sua inteligência e clareza teórica.
Em 1956, Carlos Danielli e a sua primeira esposa, Thelma Campos, foram presos em uma estação ferroviária do Rio de Janeiro, acusados de serem “pombos-correios” do comunismo (que, desde 1947, já havia se tornado ilegal). A sua prisão foi noticiada nos jornais da época, que chamavam o casal de “viajantes vermelhos”. Pela primeira vez de muitas, Carlos receberia também a alcunha de “subversivo”. A partir dessa prisão, as forças da repressão que estavam se articulando para o golpe de 64 passaram a seguir de perto os passos de Danielli tendo conhecimento, inclusive, das divergências internas do PCB.
Essas divergências fizeram com que a crise no partido comunista se agravasse, quando uma parcela dos dirigentes decidiu mudar algumas diretrizes com o objetivo principal de voltar à legalidade. Dentre elas, a mudança de nome, embora permanecendo a mesma sigla. De Partido Comunista do Brasil passaria a se chamar Partido Comunista Brasileiro, além de começar a se opor à aproximação com o Maoísmo, ideologia colocada em prática por Mao Tse Tung na China, onde a Revolução Socialista partiu do campo.
Carlos, juntamente com outros partidários, entre eles Maurício Grabois, Pedro Pomar e João Amazonas, se posicionaram em defesa das ideologias que estiveram presentes desde a fundação do partido e criaram uma dissidência. Em um dos seus artigos, escrito para o jornal do partido, “A Voz Operária”, ele reafirma as suas convicções, dizendo que “o partido não é e não pode ser um fim em si mesmo, mas o instrumento da Revolução”. Em agosto de 1960, a revisão nas diretrizes do partido foram aprovadas e também os dirigentes e membros que se opuseram a ela, entre eles Carlos Danielli.
A convicção em defender os ideais do partido fez com que Carlos Danielli adquirisse ainda mais respeito. O jornalista Osvaldo Bertolino, que escreveu a biografia “Testamento de Luta – A vida de Carlos Danielli”, conta que, apesar de não possuir formação acadêmica, Carlos dialogava e debatia com o mesmo nível intelectual dos dirigentes que eram filósofos, sociólogos e possuíam mais estudo. “A clareza teórica e intelectual do Danielli era admirável. Ele estava à altura de intelectuais do partido, como Maurício Grabois e João Amazonas, e usou toda a sua capacidade de argumentação para defender os ideais do partido”.
A capacidade de aprender de Carlinhos veio muito cedo. Sua irmã Virginia garante que, desde criança, ele sempre gostou de ler e escrever. Ajudou o pai durante a campanha e, depois de eleito, gostava muito de ensinar. “Naquela época, se escrevia mais à mão. Quando ele começou a usar a máquina de escrever, batia várias letras por minuto. Ele era muito hábil com as palavras, a gente ficava impressionado”. Além da escrita, Carlos aprendeu outros idiomas sozinho. Esse aprendizado o ajudou nas viagens que fez aos outros países de vertente comunista, como Cuba, China e Rússia.
Quando começaram as viagens, a família já percebia que o destino de Carlinhos era ser um cidadão do mundo. Virgínia conta que todos sentiam muita falta do primogênito, principalmente a mãe, e que cada notícia de que ele estava bem era um alívio para o coração de todos. “As viagens eram longas, duravam entre oito meses e dois anos. Tudo o que a gente podia fazer era pedir para Deus tomar conta dele”.
Nessas viagens, Carlos sempre fazia amizades e cativava a todos, devido ao seu carisma nato. Osvaldo Bertolino afirma que a simpatia, a cordialidade e o bom humor de Carlos Danielli eram seu diferencial. “Todas as pessoas com quem conversei depois de lerem o livro me disseram que criaram simpatia pelo Danielli. Ele sempre fazia brincadeiras, contava piadas e tinha uma capacidade única de unir as pessoas por onde quer que ele passasse”.
Também foi o carisma de Carlos Danielli que o fez amigo de Amelinha Teles, sobrevivente da ditadura, que foi presa com ele e testemunha da verdadeira causa de sua morte. Amelinha diz que Carlos era uma pessoa simpática, alegre, entusiasta com tudo e bem-humorado. “Tudo isso me transmitia segurança e bem-estar. Ele era extremamente determinado pela justiça social. Era o lado político que me fez admirá-lo. Coerência e determinação”.
O carisma de Danielli foi um dos fatores que ajudaram o PC do B em sua consolidação. Com os militares ascendendo ao poder, no fim de 1963, ele percorria o país para reatar contatos e começou a escrever e editar o jornal do PC do B, “A Classe Operária”. O jornal era impresso em um “aparelho”, casa onde os militantes se encontravam na clandestinidade, e com cerca de 400 exemplares mensais, cumpria papel fundamental na resistência contra a ditadura.
O responsável pela impressão do jornal e entregá-los a Danielli era César Teles, marido de Amelinha. Eles se encontravam em “pontos”, encontros rápidos em locais clandestinos, para que Danielli pudesse pegar os exemplares e distribuí-los. Na época, era um dos mais procurados pela repressão política e usava o nome falso de Antônio. “Ele devia ter uns 35 a 36 anos, era bastante agitado. De imediato, me passou várias tarefas, como por exemplo traduzir textos do espanhol para o português”.
Esses pontos eram também as únicas oportunidades de a família ter notícias de Carlinhos. Virgínia, de vez em quando, comparecia a encontros, sempre muito rápidos, em locais isolados e de maneira clandestina. “Ele não podia entrar em contato sempre com a gente, para se proteger e nos proteger. Eram nesses encontros que a gente levava as coisas que ele precisava e sabíamos que estava bem”.
A essa altura, o cerco já estava apertado para os militantes do PC do B, principalmente para Carlos que, além da direção do jornal do partido, era o cérebro da Guerrilha do Araguaia. A casa do irmão Paschoal Danielli chegou a ser invadida pelos militares, que buscavam provas contra Carlos. “Eles foram lá porque era o endereço que meus pais moravam. Mas não acharam nada e continuaram rondando, tentando achar o Carlinhos”, conta Virgínia, que diz que essa perseguição deixa, ainda hoje, marcas em sua família. Essa perseguição fazia com que ele mudasse com a família de tempos em tempos, além de permanecer durante a maior parte do tempo nos aparelhos, com outros companheiros de partido.
Foi quando estava alocado em um desses aparelhos, em São Paulo, que Carlos Danielli foi preso, juntamente com Amelinha Teles e seu marido. A prisão aconteceu no dia 28 de dezembro de 1972, quando os três seguiam para um ponto com outros militantes do PC do B. Foram pegos em uma emboscada planejada pela repressão e levados para o DOI-Codi de São Paulo, onde um batalhão de policiais aguardava por eles. Eram os últimos e mais sofridos dias da vida de Danielli.
A ditadura militar no Brasil deixou 434 mortos e desaparecidos políticos durante o período, que durou de 1964 a 1985, de acordo com os relatórios finais da Comissão Nacional da Verdade, órgão criado pela presidente Dilma Rousseff para apurar e esclarecer os crimes da ditadura. Esses números, no entanto, foram imprecisos e acredita-se que sejam muito maiores. De acordo com o historiador Fabiano Macedo, o fato de as investigações da Comissão da Verdade terem começado muito tarde, quase 20 anos depois do fim do regime militar, contribuiu para a imprecisão dos dados obtidos.
“Muita coisa foi destruída, muitas testemunhas já estavam mortas. Diferentemente de outros países latinos, como Argentina e Chile, onde os torturadores foram condenados pouco tempo após o regime, o que facilitou as investigações. Além disso, guerrilhas como a do Araguaia aconteceram no interior, dominado pelo coronelismo. Houve muitos desaparecidos que sequer foram documentados. Com certeza, o número de vítimas no Brasil foi muito maior, principalmente se levarmos em conta a extensão continental do nosso país. Além disso, foram poucos os torturadores aqui que foram denunciados e nenhum foi preso por causa da Lei da Anistia”.
Um dos torturadores denunciados depois da entrega do relatório final da Comissão da Verdade foi o coronel da reserva Carlos Alberto Brilhante Ustra, falecido em 2015, aos 83 anos, em decorrência de um câncer. Era Brilhante Ustra o comandante responsável pelo DOI-Codi de São Paulo na ocasião da prisão e morte de Carlos Danielli. Ele quem destacava as equipes de tortura, que eram classificadas por letras, e acompanhava os depoimentos das testemunhas encaminhadas para o Centro de Investigação.
Apesar de ser um torturador confesso e declarado pela justiça brasileira, Brilhante Ustra foi homenageado em ocasião da votação do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, em 2016. O autor da homenagem foi o deputado federal pelo Rio de Janeiro, Jair Messias Bolsonaro. Para Osvaldo Bertolino, “declarar apoio a um torturador é uma depravação, um insulto, uma atitude abjeta, principalmente por parte do deputado. Não dá para fazer uma análise teórica dessa fala dele, que é a mais pura expressão da bestialidade. Essa tem sido uma ideologia que está se espalhando ultimamente: a ideologia da bestialidade. A pessoa fica esvaziada do humanismo, deixa de ser humano”.
Amelinha assistiu à declaração: “Quando os parlamentares não reagiram ao ataque ao estado de direito feito por aquele deputado, acabaram se submetendo a um golpe misógino, brutal, com graves consequências à democracia, o que só tem trazido retrocesso ao nosso país. O torturador Ustra comandou as torturas e o assassinato do Danielli na Rua Tutóia, 36ª DP, onde funcionava o DOI-Codi. Comandou as torturas contra mim e toda minha família. Sequestrou minhas crianças com 5 e 4 anos de idade, no final do ano de 1972. Comandou as torturas contra a presidenta Dilma. Tem uma lista de mais de 50 assassinatos de militantes da época sob a responsabilidade do coronel”.
Entre esses assassinados está Danielli. Ele ficou quatro dias sob o poder do regime militar. Foi torturado de todas as maneiras utilizadas durante o regime, passou pelas mãos das quatro equipes de tortura, comandadas pessoalmente pelo coronel Ustra, conhecido como “Tibiriçá”, mas não disse uma palavra. No quarto dia, a ponto de desfalecer, escreveu com o próprio sangue nas paredes da cela mínima onde estava isolado: “Este sangue será vingado”.
Foi a irmã de Amelinha Teles, Criméia Alice, quem viu Carlos Danielli com vida pela última vez. Ela foi levada pelos militares a fim de que reconhecesse Carlinhos, conhecido na vizinhança como irmão dela e de Amelinha. Ao ver o companheiro, Criméia quase não o reconheceu: Carlos sempre fora magro, mas estava com a barriga muito inchada, em decorrência dos constantes golpes que danificaram o fígado; o rosto estava inchado e deformado e da sua boca saía sangue e uma espuma rosa. Ele ainda respirava, mas estava em coma profundo. Não muito depois, na tarde do dia 31 de dezembro de 1972, Carlos Nicolau Danielli morreu, aos 43 anos, não em decorrência de um tiroteio com a polícia, mas de intensa tortura por defender os seus ideais e os seus companheiros até o fim.
A notícia e o depois da morte
A notícia da morte de Carlinhos chegou à família como todas as últimas notícias que tinham dele: por meio dos jornais. Seus pais e seus irmãos viram a sua foto no “Jornal Nacional”, que sempre acompanhavam para tentar saber por onde ele andava. Virginia Danielli relembra o quanto seus pais sentiram pela perda do filho e, principalmente, por não darem a ele o enterro que Carlinhos merecia. “Minha mãe, principalmente, chorou muito, sofreu demais. Meu pai, além do sofrimento, sentia culpa, porque foi por influência dele que Carlinhos entrou para a política”.
A notícia da morte de Carlinhos chegou à família como todas as últimas notícias que tinham dele: por meio dos jornais. Seus pais e seus irmãos viram a sua foto no “Jornal Nacional”, que sempre acompanhavam para tentar saber por onde ele andava. Virginia Danielli relembra o quanto seus pais sentiram pela perda do filho e, principalmente, por não darem a ele o enterro que Carlinhos merecia. “Minha mãe, principalmente, chorou muito, sofreu demais. Meu pai, além do sofrimento, sentia culpa, porque foi por influência dele que Carlinhos entrou para a política”.
Mas as notícias publicadas nos jornais no dia 5 de janeiro, quase seis dias após a morte de Carlinhos, eram forjadas. De acordo com elas, Carlos Danielli era um “terrorista, que entrou em confronto com a polícia”. Laudos plantados pela inteligência do regime militar deram conta que Danielli havia sido atingido por três tiros e morrido em decorrência disso (Laudo-da-morte-de-Carlos-Danielli, em PDF). Esse tipo de notícia plantada, de acordo com Osvaldo Bertolino, era comum durante a ditadura.
“A ditadura forjava as situações e passava para a mídia, que divulgava amplamente. A troca de tiro que forjaram para a morte do Danielli foi divulgada, inclusive, no ‘Jornal Nacional’. Era o típico conceito da ditadura, que é o de guerra suja, onde não há consideração pelos direitos humanos e nem pelo regulamento internacional que impõem limites às guerras”. Como um morto de guerra, Carlos Danielli foi enterrado como indigente, no cemitério de Perus, famoso por receber os corpos dos mortos pelo “Esquadrão da Morte” da Ditadura Militar.
Amelinha Teles, quando foi solta juntamente com seu marido, ouviu as notícias de que Carlos Danielli havia sido morto em confronto com a polícia. Prontamente de dispôs a esclarecer a verdade: Danielli havia sido torturado até a morte. A princípio, nem mesmo a família queria acreditar no que ela dizia. Mas Amelinha estava tranquila, sabia que Danielli estava em paz. “Danielli não fazia planos para quando a repressão terminasse. O que ele gostaria de ver era o socialismo se desenvolver em nosso país. Ele admitia que muito provavelmente não estaria vivo para celebrar a vitória final”.
Sobre as memórias que tem sobre Danielli, Amelinha garante que são muitas. A mais significativa foi o seu humanismo, sua coerência, sua determinação em defender a humanidade, mesmo perdendo sua vida. “Sempre que alguém me fala que o problema está no ser humano, eu digo ‘não: há seres humanos que são coerentes, solidários e dignos’. É o caso do Danielli, que foi uma pessoa digna até o último momento de sua vida. Sob intensa e cruel tortura, Danielli não entregou nenhum companheiro, morreu sem dar uma informação aos seus algozes. Morreu altivo como sempre viveu”.
Para o PC do B, Carlos Danielli permanece sendo um exemplo. Em nota, o partido diz que “Danielli representou a luta teórica e teve papel central na reorganização do PC do B depois do racha e na Guerrilha do Araguaia, que foi o principal movimento contra a ditadura. Ele foi fundamental não só para o PC do B, mas para a luta contra a ditadura e a favor da redemocratização do país”.
Osvaldo Bertolino diz que a biografia sobre Danielli se chama “Testamento de luta”, porque, durante o seu testemunho, o militante disse que o único testamento que faria seria o testamento político, que seria de paz, democracia, socialismo, humanismo, fraternidade, igualdade e justiça social. “O PC do B se sustenta em cima desse testamento político declarado por Danielli. Ele foi fundamental para reafirmar esse papel do partido e é o que o partido busca seguir ainda hoje”.
Para a família, as lembranças que ficam de Carlinhos são do irmão, filho e tio alegre, protetor e inteligente. Virgínia diz que as memórias que guarda são dos tempos de infância, quando mesmo a condição financeira não sendo das melhores, eles eram felizes. “Eu me lembro dele como o filho prestativo, o irmão carinhoso e muito presente. Só temos coisas boas para lembrar dele”. Virgínia conta ainda que a família faz questão de passar para as gerações mais novas tudo o que ele representou. Prova disso é seu sobrinho-neto Lucas Danielli, estudante de publicidade de 22 anos. Apesar de nascido muito depois da morte do tio, Lucas afirma sentir muito orgulho da história que carrega e pretende manter viva a trajetória de lutas e ideais do tio. “Para a família, o tio Carlinhos representa a revolução e a mudança. Toda a luta e ideais dele servem de inspiração para a gente e são motivo de muito orgulho”.
Homenagens póstumas
Em abril de 1981, quase dez anos após a morte de Carlos Nicolau Danielli, a família e a dirigência do PC do B deram início à trajetória a ser percorrida para que ele tivesse um enterro digno. No dia 11, o irmão de Carlinhos, Jurandir Danielli, seu filho mais velho, Wagner Danielli, e seu ex-cunhado, Gerson Campos, juntamente com João Amazonas e Renato Rabelo, representantes do PC do B, foram ao cemitério de Perus, em São Paulo, acompanhar a exumação do corpo de Danielli.
O caixão utilizado para enterrar indigentes foi aberto e o corpo reconhecido. Os restos mortais foram transladados para Niterói e uma cerimônia foi realizada na sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) com participação de 200 pessoas, entre elas Amelinha e Cesar Teles, que estiveram presentes nos últimos dias de vida de Danielli.
No dia 11 de abril de 1981, os restos mortais de Carlos Danielli foram depositados no cemitério de Maruí, em Niterói, sob comoção de uma pequena multidão. Osvaldo Bertolino conta que essa comoção se deve ao fato da admiração de todos por Carlinhos. “Apesar de ter vivido pouco, ele gerou grande admiração nas pessoas que conheceu e que conheceram a história dele. Eu fiquei uma semana em Niterói, conversando com a família, amigos e conhecidos dele por ocasião do livro. Todos falaram com grande carinho e saudosismo sobre ele”.
O livro “Testamento de Luta – A Vida de Carlos Danielli” foi o primeiro de quatro livros escritos por Osvaldo sobre os grandes nomes do PC do B. “Existia um completo silêncio a respeito do Danielli. O que se sabia sobre a morte dele era a versão dos militares que, aliás, eram versões diferentes, que não batiam com a situação nem com o laudo e nem com o que as testemunhas oculares, como Amelinha Teles, deram”.
Osvaldo afirma que a maior dificuldade para escrever o livro, em 2002, era a de encontrar material. A pesquisa era feita de maneira manual e não existia ainda toda essa documentação sobre a ditadura disponível online como apareceu depois da Comissão da Verdade. “Conseguimos documentos no arquivo da Cedem, no arquivo do partido e a partir de contatos que tomavam conta de alguns documentos de legistas da ditadura”. O autor ainda diz que há planos para reescrever o livro, enriquecendo-o com mais depoimentos e documentos.
Além do livro, Carlos também foi homenageado com um episódio no programa “Detetives da História”, do History Channel. O programa intitulado “O ferrete de marcar escravos e o casaco do guerrilheiro” mostra a trajetória do apresentador para encontrar a família de Danielli, a fim de devolver um casaco que estava em posse de Ronald Rocha, companheiro de Carlos Danielli e Cesar Telles.
Virgínia Danielli, que participou do documentário representando a família, diz que se emocionou muito ao rever o casaco que o irmão havia trazido de uma das suas muitas viagens mundo afora. “Eu conhecia aquele casaco. Carlinhos gostava muito dele, todos achamos muito bonito quando ele trouxe. Foi como reencontrar um pedacinho dele de novo”.
E não é só quem vê o documentário ou lê o livro que pode reaver memórias de Carlos Danielli. Quatro ruas no Brasil – duas em São Paulo e duas no Rio de Janeiro – carregam o nome Carlos Danielli que, ao contrário do que quiseram fazer acreditar, não foi um “subversivo”, “terrorista” e “aliciador de jovens”, mas aquele lembrado por sua irmã, Virgínia, sua amiga, Amelinha Teles e seu biógrafo, Osvaldo Bertolino, como um homem alegre e carismático, que morreu para defender aquilo pelo que lutou em vida: a igualdade, a justiça social, a paz e a democracia.
Reportagem de Raiane Godinho e Valdirene Martins para a disciplina Jornalismo Especializado, com mentoria dos editores do Diário da Província e da AgênciaUVA
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